Código de Ética



Toda doutrina espiritual se origina de um conjunto de revelações espirituais dos seus fundadores. Por sua vez, estas revelações e experiências espirituais marcantes dão origem a um conjunto de ensinamentos e práticas. No entanto, como tudo isto acontece numa cultura específica e num tempo determinado, estes fatores culturais sempre estão misturados dentro do corpo doutrinário.

O maior desafio nestes casos é que quanto mais uma tradição se expande e universaliza, nem sempre é possível transpor integralmente o contexto cultural onde ela é gerada. Isto exige uma grande sensibilidade para manter a essência dos seu ensinamentos e ao mesmo tempo a flexibilidade para que estes possam ser corretamente assimilados pelo novo contexto cultural

No nosso caso não poderia ser diferente. Desde os tempos do Mestre Irineu e depois, no seguimento dado pelo Padrinho Sebastião, nosso movimento sempre esteve impregnado destes valores “caboclos”. Depois, a própria expansão colheu gente dos mais diversos segmentos sociais que tanto assimilaram estas influências culturais como por sua vez trouxeram outra cultura proveniente dos grandes centros urbanos.

Por isto torna-se muito importante a fixação dos preceitos espirituais e também de um código de ética que expresse os princípios universais de uma tradição que podem ser partilhados e aceitos por diversas culturas. Principalmente na falta dos códigos orais e informais, estas garantias de uma conduta ética são indispensáveis.

Nosso verdadeiro código de ética se encontra dentro dos preceitos dos hinários. Neles encontramos ensinamentos de grande sabedoria para o nosso bem viver. No entanto, o crescimento da doutrina, seu desenvolvimento em outros países e outras línguas e culturas torna necessário definir alguns preceitos éticos para tornar estes princípios acessíveis para todas as culturas.

Para garantir que nossa prática espiritual possa estar sustentada nos valores universais e nos direitos humanos, inspirados em princípios positivos e sadios, válidos para todos os povos e culturas, definimos aqui alguns deste preceitos, constantes do nosso Código de Ética:

1) Prólogo
Como membros desta Irmandade, é nosso intuito manter as tradições da doutrina do Santo Daime, a fim de favorecer a transformação e evolução de todas as pessoas que buscam iluminação e cura para a mente, corpo e espírito. Desejamos também proteger, promover e encorajar a vivência da doutrina e de seus ensinamentos, o amor a Deus, amor à Terra e a todos os seres da criação, incluindo o amor a si mesmo, amor e respeito por todos os irmãos e irmãs, aceitar a verdade da nossa revelação espiritual e ao mesmo tempo ter tolerância com as falhas de cada um, através da prática do perdão, compaixão e humildade.

2) Nosso propósito
Os membros da irmandade, tanto dirigentes quanto neofitos, devem realizar seu trabalho desempenhar suas atividades com honestidade, integridade e sabedoria. A ninguém será concedido direito de se colocar acima das virtudes e dos valores apregoados pela Doutrina.

3) Direitos dos participantes
Procuramos preservar a autonomia e a dignidade de cada pessoa. A participação nos trabalhos deve ser voluntária e baseada em prévio conhecimento e consentimento dado individualmente por cada participante. O conhecimento prévio deve incluir a discussão de cada elemento da prática que possa representar risco físico ou psicológico, incluindo medicação contra-indicada ou considerações sobre a adequação da dieta. Os participantes devem também ser avisados de que esta participação pode ser difícil e dramaticamente transformadora. O consentimento deve incluir informações sobre o histórico médico, formulários de consentimento e regras gerais para os trabalhos. Os limites de comportamento dos participantes e dos membros da comunidade deverão ser esclarecidos e acordados prèviamente. Todas as medidas cabíveis serão tomadas para assegurar a saúde e segurança dos participantes durante os trabalhos e durante os períodos vulneráveis que se seguirem a eles.

4) Confidencialidade
Respeitamos a privacidade e a confidencialidade de cada participante por ocasião dos trabalhos espirituais e nas atividades sociais dentro comunidade. Desestimulamos o falar sobre outras pessoas e a propagação de boatos e informações sem fundamento comprovado do que ocorre na comunidade e na vida de cada um, o que se constitui naquilo que o Mestre denominava “correio da má notícia” . Entendemos que este tipo de prática mina a confiança e o respeito entre os membros, gerando competição , desconfiança e desunião. Em lugar disto, incentivamos o uso da sinceridade e da amabilidade como forma de uma comunicação clara entre todos e que seja também coerente com os valores dos hinários e das nossas crenças espirituais.

5) Dinheiro
Concordamos em respeitar a propriedade do outro, ajudar a implantar a consciência na utilização de todos os recursos da terra, manter a honestidade ao lidar com o dinheiro e em todos os momentos praticar ações comerciais claras e honestas. No espírito de servir, esforçamo-nos para facilitar a frequência aos trabalhos daqueles que eventualmente não possam contribuir com mensalidades, e outras formas de doação ou trabalho voluntário, conscientizando porém estes irmãos e irmãs da necessidade de se assumir algum tipo de responsabilidade material para a manutenção da nossa egrégora e a obtenção da nossa bebida sacramental, desde que esta seja voluntária, razoavel e adequada a condição de cada um. Respeitamos também a sacralidade do trabalho espiritual e evitamos a promoção de produtos e serviços ou quaisquer outras formas de solicitação ou exploração no ambiente dos trabalhos

6) Competência
Para manter a integridade dentro de nossa comunidade, reconhecemos a excelência do conhecimento espiritual praticado e preservado pelos mestres, padrinhos e madrinhas, anciões e anciãs da nossa tradição. Concordamos também que estes conhecimentos sobre nosso ritual, doutrina e administração do nosso sacramento devem ser legados para as novas lideranças espirituais através de um sólido processo de capacitação e transmissão deste conhecimento. Concordamos ainda em buscar a ajuda de outras práticas e saberes específicos, mediante agentes e profissionais qualificados, que sejam benéficos para a assimilação das experiências espirituais profundas de transformação pessoal, principalmente aquelas que que envolvem questões de projeção, transferência e contra-tranferência.

7) Tolerância
Concordamos em praticar abertura e respeito pelas pessoas cujas crenças são contrárias às nossas. Compartilhamos os ensinamentos do Santo Daime com aqueles que procuram este caminho e estas verdades ao mesmo tempo em que reconhecemos que fazer proselitismo é proibido. Para ajudar a salvaguardar contra as consequências nocivas da ambição pessoal e organizacional, evitamos a promoção ativa da Igreja.

8) Uso de Substâncias
Não autorizamos o uso de qualquer substância ilegal durante os trabalhos ou na área do templo e suas vizinhanças.

9) Assédio e discriminação
Concordamos em garantir um ambiente livre de qualquer forma de assédio, incluindo discriminação por motivo de idade, sexo, religião, credo, origem étnica ou orientação sexual. Para proteger o bem-estar de todas as pessoas, concluímos que relações sexuais inapropriadas, imposição de opiniões, preconceitos ou preferências pessoais de qualquer tipo são prejudiciais ao bem-estar do indivíduo e da comunidade.

10) Integridade
Esforçamo-nos para estar conscientes de como nosso próprio sistema de crenças, valores, necessidades e limitações nos afeta e influi na nossa capacidade para servir aos outros de forma imparcial e isenta. Para evitar que ocorra , em alguma situação qualquer tipo de injustiça, estamos dispostos, sempre que necessário, a examinar nossas próprias motivações e praticar reflexões pessoais e auto avaliações coletivas que ajudem a promover o nosso próprio crescimento pessoal e dos demais envolvidos, no que se refere à ética. Quando em dúvida se uma situação particular possa violar o Código de Ética, concordamos em consultar o conselho apropriado para escolher a melhor resposta. Se uma situação mostrar que o Código de Ética foi violado, concordamos em dizer a verdade e em ajudar a remediar a situação.

11) Conselho
No caso de conflitos ou dificuldades entre as pessoas, vamos procurar primeiro resolver o problema diretamente com o indivíduo. Se a situação não se resolver, concordamos em procurar primeiramente conselho e/ou orientação de um líder ou de um membro mais antigo da comunidade, o Padrinho ou Madrinha ligado(a) à Igreja/ponto, ou ao Conselho de Igrejas. Durante todo o processo deveremos nos ater aos princípios de confidencialidade acima citados.


Nossa tradição espiritual trás uma mensagem de amor cristão e de caridade. Nesta medida, ela tem correspondido a demanda de espiritualidade existente em todos os continentes. Estes princípios universais têm prevalecido, independente das diferenças de língua e de cultura. A expansão da nossa Igreja e a prática da doutrina do Santo Daime nos diversos países onde ela tem se processado, tem sido, além do seu conteúdo espiritual, uma manifestação de engrandecimento da língua portuguesa e da nossa cultura. Fato constatável no aumento considerável de estudos e pesquisas acadêmicas sobre este tema, assim como o grande numero de irmãos e irmãs das igrejas do exterior que têm frequentado cursos de língua portuguesa e se interessado em estudar nossa cultura.